terça-feira, 21 de maio de 2013

A DOR DO OUTRO PODE SER A NOSSA





        Enquanto fingia comer um doce de morangos, ela ocultava as lágrimas segurando o rosto com a mão esquerda. Vez por outra olhava em volta para se certificar de que ninguém a observava. Impossível não vê-la. Era uma mulher de traços marcantes, bem vestida, usava sapatos de salto alto e tinha uma flor pequena tatuada no ombro direito. Ocupava uma mesa central de uma confeitaria no centro da cidade. Estava só, irremediavelmente só, com sua dor estampada no rosto. Disfarçava o pranto incontido procurando algo na bolsa de couro marrom. Homens e mulheres passavam por ela, ocupavam cadeiras próximas a sua e não percebiam seu sofrimento. Ninguém mais tem tempo para olhar quem está ao seu lado. Estamos sempre com pressa, atrasados e ocupadíssimos. Uma parada para um café é o tempo máximo que dispomos numa tarde de segunda feira.
       Fiquei a observá-la de longe. Não a conhecia. É engraçado como encontramos algumas pessoas repetidas vezes e, sobre elas nada sabemos. No entanto, ela era para mim uma ilustre desconhecida.  Talvez nem morasse na cidade e aqui estivesse somente de passagem. Pensei em abordá-la, oferecer ajuda, perguntar se queria que eu a ouvisse, mas decidi não me arriscar.  Ela poderia entender essa atitude como uma invasão da sua intimidade. Às vezes usava um lenço para limpar a maquiagem borrada pelas lágrimas. Discretamente ela olhava em volta para se certificar de que ninguém tinha prestado atenção nela. Passei a imaginar diferentes causas para aquela tristeza. Um problema de saúde chegado de surpresa, uma decepção com a melhor amiga, o final de um relacionamento?  Poderia também não ser nada tão sério.  Muitas vezes somos surpreendidos por momentos de extrema fragilidade que nos derrubam e nos fazem chorar em público. Sabemos o que vale e o que não vale a pena nessa vida, por isso nossa sensibilidade, às vezes, deselegantemente extrapola seus limites. Então, a bela mulher se dirigiu até o caixa, pagou e se retirou sem olhar para trás. Nunca mais a vi. Em mim ficou uma sensação de vazio, de omissão, de desumanidade. E daí se ela tivesse me dito para deixá-la sozinha, que era um problema particular dela e que não estaria disposta a dividir comigo? Tudo bem, nada que eu não pudesse entender. E se minha ajuda fosse bem-vinda? E se ela precisasse apenas ser ouvida?  Odiei o meu egoísmo, a minha falta de solidariedade e a minha indiferença pela dor da desconhecida.
       É preciso prestar mais atenção nas pessoas. É preciso fugir da tirania da pressa. O automatismo que caracteriza nossa época está nos deixando muito insensíveis. A cumplicidade entre as pessoas é a melhor forma de demonstrar afeto. Quero aprender a valorizar mais o ser humano e apostar menos nas coisas. Torço para que a vida daquela mulher tenha se tornado mais doce e que ela tenha sobrevivido àquele momento doloroso.