sexta-feira, 12 de julho de 2013

LEMBRANÇAS DA INFÂNCIA



          O termo infância, etimologicamente significa ausência de fala. O infante troca sílabas, confunde significados, tem um vocabulário pobre. Nessa fase, a linguagem é escassa, mas a imaginação e a criatividade são abundantes. Não é por acaso que esse é o tempo que mais deixa saudade. Eu fui uma criança abençoada. Sinto o cheiro da infância, sinto o gosto da infância, sinto a inquietude da infância. Guardo lembranças memoráveis dessa época. Revivo momentos que me marcaram com tanta sagacidade que permanecem intactos na minha mente e na minha alma. E para lá eu retorno nas noites de insônia, nos momentos de muita ansiedade ou quando penso que tudo está perdido, sempre na tentativa de contrapor épocas tão distintas.  O poeta dizia que a vida é a arte do encontro embora haja tantos desencontros. A infância é o local dos meus encontros. Como era lindo o pomar da minha casa e como eram grandes os dois pés de pera plantados ao lado do muro! Do alto dos meus quatro anos eu imaginava que suas folhas alcançavam as nuvens. Nas noites de vento norte, seus galhos  carregados de frutas batiam no telhado da casa fazendo um barulho ameaçador. Assustada e imaginando histórias fantasiosas, eu escondia a cabeça embaixo do travesseiro e rezava para o meu anjo da guarda. Minha mãe dizia que ele protegia até as meninas arteiras. Na manhã seguinte, às vezes já com chuva – depois de três dias de vento norte sempre chove- o quintal amanhecia como um tapete verde. Minha tarefa era juntar as peras caídas, colocá-las em um cesto de vime para depois descascá-las. Minha mãe fazia doce com calda que era guardado em potes de vidro bem fechados para serem servidos às visitas nos domingos. Algumas peras eram assadas em um forno a lenha e servidas ainda quentes na hora do lanche. Ainda sinto o gosto das peras assadas. Quando as folhas das árvores caíam e seus galhos ficavam nus, eu aguardava a nova florada e acompanhava outra vez a transformação das minúsculas flores em frutinhas, e eram tantas que faziam os galhos se curvarem. A felicidade vinha de coisas tão simples.  Como explicar a singeleza das folhas verdes bailando no ar? Essas pequenas lembranças me causam melancolia alguma vezes. Sinto saudade de um tempo que não mais voltará e que ainda desperta em mim sensações inexplicáveis.

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