quinta-feira, 10 de março de 2016

EDUCAR É PRECISO

Estava subindo a Venâncio Aires numa dessas tardes quentes de fevereiro, quando percebi que o tempo mudou de repente. O céu antes escandalosamente ensolarado deu lugar a nuvens negras que se movimentavam com rapidez.  Um grande temporal se armava na minha Santa Maria. As pessoas ficam agitadas quando isso acontece.  Na minha frente, seguiam apressadas mãe e filha de mãos dadas. A menina que deveria ter uns 5 ou 6 anos, chorava porque queria um sorvete. Não sei exatamente qual o combinado entre elas antes, mas certamente o temporal que se insinuava alterou os planos da mãe. A menina não aceitava e queria porque queria o tal do sorvete. A mãe então argumentou que a chuva estava próxima e elas teriam que correr até a parada para não perderem o ônibus. De nada adiantou a explicação. O choro da filha, a princípio manso, foi aumentando até se transformar numa súplica birrenta e medonha. Segui observando a cena para ver o desfecho. A menina, com toda a tirania peculiar de criança sem limites continuava testando a mãe, que, como todas, carregava aquele pesado sentimento de culpa por ver um filho contrariado. Junta-se a isso a vergonha que estava sentindo por ser personagem de um espetáculo que já chamava a atenção das pessoas que por ali passavam. Foi então que a mãe iniciou o processo mais rápido de perda de autoridade materna: negociou com a menina:
- De noite eu faço batata frita pra ti, prometeu a mãe.
- E massinha também, determinou a filha.
- Massinha também, concordou a mãe.
A pequena ditadora enxugou as lágrima, ergueu o rostinho brejeiro e ambas subiram no ônibus. Acompanhei com o olhar abstraído o coletivo que dobrou na Avenida Rio Branco. Fiquei pensando cá com meus botões: que oportunidade essa mãe perdeu de ensinar limites a uma criança. Educar é trabalhoso, exige paciência, firmeza, equilíbrio. E as mães têm dificuldade de dizer não, pois o não é sempre uma frustração de um desejo. No entanto, são justamente essas pequenas frustrações que vão formando o caráter de uma criança. Na cena que eu assisti, aquela mãe achou mais confortável ser conivente com a manipulação da filha e colocar um ponto final no problema. Os padrões comportamentais familiares sofrem uma grande desorganização.  Está se formando uma geração de príncipes e princesas com mais direitos e liberdades do que obrigações e responsabilidades. A vida aqui fora nos obriga a respeitar limites e as crianças precisam estar preparadas para isso. Melhor seria que elas aprendessem no ambiente familiar e que os pais não delegassem à escola e a seus professores esses ensinamentos. Segui meu caminho torcendo para que a chuva esperasse eu chegar em casa.

Ângela Lorenzoni Sauthier

Março/2016