terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O CICLO DA VIDA



    Na última primavera recebi uma visita singular. Uma delicada pombinha pousou no muro do meu quintal. Toda manhã ela voltava silenciosa e ali permanecia atenta, contemplativa e ficava a observar as árvores, os galhos das roseiras, as flores. E eu com esse meu raciocínio lógico tentava entender as reais intenções da ave. Afinal o lugar dos pássaros é no céu azul, nas chaminés, nas torres da igrejas, no alto das árvores. E ela ali, sobre o muro admirando meu jardim.





     Como eu poderia imaginar que aquele olhar tímido da pomba estaria à procura de um lugar para construir seu ninho?    
  Minha visita foi paciente, criteriosa e tremendamente transgressora, Escolheu o vaso de gerânios mais floridos que tinha na minha varanda.
      Durante um longo tempo a pomba ali permaneceu chocando seus ovinhos numa relação amorosa responsável.




      Numa manhã de domingo, o milagre da vida aconteceu. Os ovos se romperam e nasceram duas pombinhas num vaso de flores coloridas. 
      A pombinha protegeu seus filhotes com o zelo natural de todas as mães. Ninguém podia se aproximar do ninho.





         O papai pombo se fez presente no momento de alimentar as pombinhas. Alçou vários voos generosos em busca de alimentos que trazia no bico e oferecia aos frágeis bebês. Era um amor em formato de coração.
       Esse ritual durou algum tempo e foi apreciado por muitos amigos que se encantavam com cenas tão pitorescas.
         Dias depois o ninho amanheceu vazio. Pude apenas ver o casal de pombos se balançando num galho de buganvília. Quanto aos filhotes? Certamente aprenderam a voar e ganharam os ares da cidade. Missão cumprida. Os pombos saíram de cena.
       Na próxima primavera vou esperar minha amiga excêntrica com outro vaso de flores, quem sabe de bromélias, gérberas ou de amores- perfeitos?




domingo, 24 de fevereiro de 2013

OLHANDO A VIDA DO ALTO


        Depois de morar por 22 anos na mesma casa, estamos às vésperas de uma mudança. É comum as pessoas temerem o desconhecido, portanto toda e qualquer mudança é sempre uma ousadia. Foi uma decisão desafiadora, pensada, estudada, repensada e decidida: vamos morar em um apartamento.
         Não foi fácil. Admito. Sair do conforto de uma casa com um jardim que se plantava gerânios no verão e petúnias na primavera é um desapego e tanto. Ter que se afastar de três cães, um vira-lata, outro meio  vira-lata e um de raça, sendo que esse último foi nosso guarda-costas durante 12 anos é no mínimo um ato de coragem. Renunciar a um espaço que abrigou muitas festas que terminavam na madrugada sem a reclamação de nenhum vizinho é um desprendimento gigantesco. É tudo muito radical, estamos balançando estruturas.
         Como acredito que a vida é feita de ciclos, estamos fechando um e abrindo outro. Vamos sentir saudade, pois cada pedacinho daqui tem uma história. Neste lugar meus filhos cresceram livres, felizes e fizeram amizades duradouras, daquelas que só se constroem na infância.
         Sou adepta à cultura da recompensa, por isso devo considerar que essa troca vai nos proporcionar o encantamento de podermos ver o sol nascer e se pôr no horizonte. Assistir da porta do quarto à chuva molhar o telhado das casas e dos prédios. Ter o privilégio de poder ficar independente do  carro em muitas ocasiões. Poder viajar despreocupadamente sem data para voltar.
        Novos hábitos serão incorporados ao nosso dia-a-dia tal como aceitar o fato de encontrar uma dúzia de vezes a mesma pessoa no elevador, na garagem, na portaria ou em reuniões de condomínio. Como apaixonada por saltos, terei que aprender a caminhar macio para não perturbar o descanso do morador do andar de baixo. Vai ser uma vida diferente daquela que estávamos acostumados. Mas estou apostando que vai dar certo. Será um reinício de tudo, um momento especial.. E como escreveu Clarissa Estés em seu livro A Ciranda das Mulheres Sábias "uma ocasião especial é qualquer ocasião à qual a alma esteja presente". Agora é só se livrar das tralhas. Vamos à mudança.