domingo, 28 de junho de 2015

MACHISMO DESVELADO

As mulheres continuam sendo vítimas jacentes de um machismo que vem atravancando o universo feminino de forma sórdida. O fato que descreverei a seguir confirma o que digo. Não foi na Grécia antiga, nem no sertão nordestino do final do século XVIII que aconteceu. Foi aqui, na cidade universitária, na minha Santa Maria da Boca do Monte dos dias de hoje. Eis que um grupo de amigas, mulheres independentes, instruídas, iluminadas e bem casadas reúnem-se para confraternizar. Motivo? Festejar a vida. Os encontros são rotineiros e desta vez acontece em uma noite fria de bater os dentes, no salão de festas do prédio onde mora uma das componentes do grupo. As amigas conversam, dançam e divertem-se. Decerto que festa é pra se alegrar e quando mulheres de bem com a vida se encontram, acontece um escarcéu. Parece que de uma costela de Adão saiu o primeiro alto-falante. Há quem diga que as pertencentes ao sexo frágil têm necessidade de falar aproximadamente 20.000 palavras por dia. Imaginem trinta mulheres concentradas em 80 metros quadrados. E a festa ia se estendendo açucarada até às 23 horas e trinta minutos quando, de repente, um homem raivoso, de cara amassada e de pijama listrado empurra a porta e entra no salão sem pedir licença e sem olhar para ninguém. Vai até o aparelho de som e de uma forma selvagem e ameaçadora, arranca o fio da tomada. Como um soldado espartano, retira-se dizendo: “chega de barulho”. Cobertas de indignação ficamos paralisadas. Durante uma fração de segundos, resgatando fiapos de otimismo que ainda tinham sobrado, pensamos tratar-se de alguma brincadeira. A alegria durou pouco, não era brincadeira. Era o síndico do prédio que considerou o horário inapropriado para festas e achou por bem desligar o som. Lembrei então, daquela caricatura do homem das cavernas arrastando uma mulher pelos cabelos. Senti-me castigada. Sim, como uma criança que fez uma arte e foi repreendida. Meu estômago ficou embrulhado. Senti vontade de chamá-lo de covarde, cachorro, sem-vergonha e outras coisas mais que as mulheres dizem para os homens. Porém, me calei. Ele não foi merecedor sequer dos meus insultos. Invadir um ambiente privado, só de mulheres (se os maridos estivessem na festa, ele não teria feito isso) e, revestido com a máscara de síndico, desligar a nossa música, não me pareceu uma atitude que caiba dentro dos moldes de civilidade. Poderia ter usado a mais eficiente de todas as ferramentas humanas para resolver o problema, a linguagem, providencial para a função que ocupa. Preferiu recorrer às armas. Sua hostilidade evidente sugere um machismo escrachado e uma estupidez rançosa, sem espaço nos dias de hoje. Ou seria ele um ginofóbico? Não precisava dessa demonstração de virilidade às avessas, afinal somos todas pacíficas, generosas e serenas. É triste constatar que ainda existam tiranos dessa espécie. A propósito, machismo é uma forma de violência. E minha Santa Maria segue cintilante e fagueira festejando a vida. Ângela M. Lorenzoni Sauthier Junho/2015